domingo, 23 de abril de 2017

Discussão pública, por José Cunha

Em notícia recente, leio, com agrado, que a Câmara de Guimarães vai disponibilizar o projeto da nova centralidade da vila das Taipas para consulta pública. Não é a prática corrente deste executivo, mas é a prova de que havendo vontade, a consulta e a discussão pública de planos e projetos podem ser devidamente anunciadas, e efetivamente acessíveis aos vimaranenses.

Em Maio do ano passado ficamos a saber que Guimarães tem um Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano (PEDU), descrito pela Câmara como “um guião de atuação no território vimaranense para os próximos anos.”. Na altura, escrevi um artigo (PEDU – Uma visão estratégica?) a manifestar a minha indignação pelo facto de nem os cidadãos, nem a oposição (tanto quanto sei) terem sido chamados a colaborar na elaboração de tão importante estratégia.

O PEDU é o requisito e instrumento para aceder aos fundos do Portugal 2020 para a mobilidade sustentável, reabilitação urbana e habitação social, tendo Guimarães já garantido 18,5 M de euros de financiamento para aplicar em projetos dessas temáticas.

O Regime Jurídico da Reabilitação Urbana (RJRU) estabelece que devem ser delimitadas Áreas de Reabilitação Urbana (ARU) e definidas as respetivas Operações de Reabilitação Urbana (ORU). Das 14 ARU`s que já estão delimitadas em Guimarães, apenas a do “Centro da Cidade” tem a ORU aprovada. Uma ORU sistemática (como é o caso desta), não é um qualquer documento, pois a sua aprovação constitui causa de utilidade pública para efeitos da expropriação (prerrogativa já utilizada) ou da venda forçada de imóveis, e pela sua importância o RJRU equipara essa operação, para efeitos de discussão pública, aos planos de pormenor, fixando um mínimo de 22 dias para que os cidadãos a possam consultar e apresentar sugestões.

Pasmem-se (ou não) a ORU do Centro da Cidade esteve em discussão pública!

Aprovada em reunião de Câmara no final de Julho, esteve em discussão pública todo o mês de Agosto. É certo que não teve direito a notícia na página eletrónica do município (ainda agora, depois de aprovada não se encontra lá), não teve direito a publicação no facebook nem a comunicado de imprensa, e não consta que o projeto tenha estado disponível para consulta no Guarda Sol ou no Enseada na Póvoa do Varzim. Teve apenas direito aos serviços mínimos, com edital publicado num jornal local em letra minúscula.

É por demais evidente, que quem coloca, sem qualquer anúncio notório, tão importante documento em discussão pública durante o mês de Agosto, não tem qualquer interesse em que esta seja participada. O objetivo só pode ter sido evitar a discussão. Porque será?

O projeto do parque de estacionamento de Camões, que faz parte dessa ORU, é contestado pela Assembleia Popular da Caldeiroa e por algumas figuras públicas da cidade, como é o caso de António Amaro das Neves, que escreveu no seu blogue “…e isto na ausência do debate público que um projecto com tal natureza e dimensão impõe. Confesso que não estava habituado a que, em Guimarães, as coisas funcionassem assim.”

Lamentando a seletividade no cumprimento das suas promessas, relembro o compromisso assumido pelo Presidente da Câmara Municipal na sua tomada de posse: “promover abertamente a discussão, partilhar as decisões com os cidadãos e implicá-los na sua realização. Governar com todos e para todos”.

Tal como eu, existe quem (creio que alguns com receio de o assumir) se recuse a habituar a que as coisas funcionem assim, pelo que não tenham qualquer dúvida de que a discussão pública do projeto para o parque de estacionamento de Camões será feita, independentemente das conveniências políticas.

Artigo publicado Quinta-feira, dia 20 de Abril, de 2017, na revista Reflexo Digital, pelo ambientlista José Cunha.

(publicámos este artigo com a autorização do autor)